Lagoa do Piauí: No primeiro mês de gestão, cidade já demonstra falta de transparência

Uma análise da publicidade dos contratos públicos dos municípios do Piauí

No Piauí, chama atenção a falta de zelo com o dinheiro público, especialmente na publicidade dos gastos dos municípios, muitas vezes em contratos sem licitação e com valores vultuosos. A situação se agrava quando as prestações de contas, que geralmente não são disponibilizadas ao cidadão, também não são apresentadas ao Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

Esse é o caso da Prefeitura de Lagoa do Piauí, onde a prefeita é apadrinhada politicamente pela conselheira do TCE-PI, Rejane Dias.

Deveria ser

Após a recente Reforma Tributária da Emenda Constitucional 132 e com o advento da Nova Lei de Licitações e Contratos (Lei Federal nº 14.133), a transparência nos gastos da administração pública, especialmente nos municípios, tornou-se uma questão de crescente interesse, sobretudo no que diz respeito à disponibilização e publicidade das despesas públicas e dos contratos assinados pelas prefeituras municipais. No estado do Piauí, por exemplo, no município de Lagoa do Piauí, administrado pela prefeita Camila Barbosa, do Partido dos Trabalhadores, alguns contratos públicos sem licitação tiveram seus extratos divulgados no Diário Oficial dos Municípios. No entanto, os documentos completos dos contratos, assinados entre os dias 8 e 9 de janeiro de 2025, não foram disponibilizados no Portal Contratos WEB do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) até a presente data de fechamento desta matéria, 10 de fevereiro de 2025, ou seja, mais de um mês.

Exemplo a não ser seguido

Exemplos como o de Lagoa do Piauí levantam uma série de dúvidas sobre a conformidade das práticas de transparência adotadas pela administração dos municípios. A ausência da disponibilização dos contratos completos no Portal Contratos WEB do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) compromete a capacidade de fiscalização e controle externo, tanto dos órgãos competentes quanto da população.

Diversos documentos e relatórios emitidos pela Diretoria de Fiscalização de Licitações e Contratos (DFCONTRATOS) do TCE-PI apontam que a publicação integral dos contratos é essencial para garantir a análise detalhada dos termos e condições pactuados entre a administração pública e os contratados. Isso permite uma avaliação da legalidade, da conformidade e da economicidade das contratações. Com isso, pode-se concluir que a falta de transparência não apenas prejudica o controle social, mas também pode indicar possíveis irregularidades nos processos administrativos.

O que diz a lei

Outro ponto a ser analisado, no contexto dos contratos assinados pelas prefeituras, é se os municípios piauienses estão cumprindo rigorosamente todos os critérios estabelecidos no artigo 72 da Lei Federal nº 14.133, que rege as licitações e contratos administrativos. Esse artigo detalha os documentos e critérios necessários para a instrução dos processos de contratação direta, seja por inexigibilidade ou dispensa de licitação.

Art. 72 da Lei 14.133

O processo de contratação direta, que compreende os casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação, deverá ser instruído com os seguintes documentos:

I – Documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;

II – Estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei;
III – Parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos;
IV – Demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido;
V – Comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária;
VI – Razão da escolha do contratado;
VII – Justificativa de preço;
VIII – Autorização da autoridade competente.

Omissão 


Dito isso, a omissão dos contratos completos no Portal Contratos WEB do TCE-PI, bem como a não disponibilização integral dos processos administrativos das contratações diretas, levanta dúvidas sobre como os cidadãos podem acessar os arquivos, fiscalizar e analisar os critérios utilizados para o gasto dos seus impostos. Sem a publicação adequada do processo administrativo (e do contrato), torna-se praticamente impossível para o cidadão comum exercer seu direito ao controle social e à fiscalização das ações da administração pública. O acesso aos documentos mencionados no artigo 72 da Lei 14.133 é essencial para assegurar a transparência e a lisura nos processos de contratação. A falta de transparência não apenas compromete a confiança da população na gestão pública, mas também pode indicar irregularidades que necessitam de uma investigação mais aprofundada pelos órgãos de controle externo.

Voltando aos contratos públicos de Lagoa do Piauí

A falta de transparência na divulgação dos contratos públicos de Lagoa do Piauí no Portal Contratos WEB do TCE-PI não só compromete a publicidade da gestão pública, mas também evidencia uma flagrante incoerência entre os objetos dos contratos assinados e a realidade prática observada. Exemplos dessa incongruência podem ser encontrados nos contratos nº 002/2025, nº 003/2025 e nº 005/2025.

Contrato nº 002/2025

O contrato nº 002/2025 de R$ 132.000,00 tem como objeto a contratação de assessoria e consultoria jurídica na área de licitação, um serviço essencial para garantir que os processos licitatórios sejam conduzidos conforme a legislação vigente e os princípios da administração pública. No entanto, a ausência da publicação desse contrato no Portal Contratos WEB do TCE-PI (até a data de fechamento desta matéria) evidencia uma falta de aderência às próprias diretrizes que a assessoria jurídica deveria assegurar. Isso levanta sérios questionamentos sobre a eficácia do serviço contratado e se a consultoria está, de fato, desempenhando seu papel de garantir a transparência e a legalidade das contratações públicas.

Contrato nº 003/2025

O contrato custando R$ 252.000,00 de nº 003/2025, cujo objeto é a contratação de assessoria e consultoria contábil para o cumprimento de, entre outros aspectos, obrigações municipais de prestação de contas ao Tribunal de Contas do Estado, também apresenta inconsistências flagrantes. A não divulgação desse contrato no Portal Contratos WEB do TCE-PI impede a análise dos termos pactuados entre o município e a empresa contratada. A ausência da publicidade desse contrato sugere uma falha na implementação dos serviços de prestação de contas contratados, colocando em xeque a eficácia desse contrato.

Contrato nº 005/2025

O contrato nº 005/2025 R$ 101.040,00 visa, dentre outros objetivos, a operacionalização de plataformas digitais, garantindo pleno funcionamento e otimização dos sistemas utilizados. Paradoxalmente, a ausência da publicação desse contrato no Portal Contratos WEB do TCE-PI revela uma incoerência gritante: como se pode promover eficiência e otimização dos sistemas digitais sem garantir a transparência e a acessibilidade das informações fundamentais à gestão pública?

Paradoxo

Essas incoerências na gestão dos contratos públicos por parte de alguns municípios, como Lagoa do Piauí, expõem um risco sistêmico na administração pública. Os contratos firmados não apenas sugerem o descumprimento de princípios como os da transparência e publicidade, mas também evidenciam ineficiência na governança.

Em contraste com a falta de transparência observada em Lagoa do Piauí, outros municípios piauienses têm cumprido suas obrigações de publicidade ao disponibilizar seus contratos no Portal Contratos WEB do TCE-PI. Exemplos incluem Floriano, Caldeirão Grande do Piauí, Pio IX, Padre Marcos, entre outros.

Sem divulgação até agora

Já estamos no décimo dia do segundo mês de mandato dos prefeitos, e a ausência de divulgação no TCE-PI dos contratos assinados em 2025 escancara uma violação ao princípio constitucional da publicidade. É imprescindível que as prefeituras regularizem a situação dos seus contratos, disponibilizando não apenas os extratos no Diário Oficial dos Municípios, mas também a íntegra do contrato e do processo administrativo no Portal Contratos WEB do TCE-PI, garantindo a efetividade do controle social e a fiscalização das ações governamentais.